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Liberais que ignoram a luta cultural são ingênuos, diz Constantino

Em entrevista especial para o Boletim, o escritor, blogueiro e economista comenta os sucessos e desafios do movimento liberal
Foto: Divulgação / Band

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Foto: Divulgação / Band

Quando se fala na recente ascensão de novas ideias na cena intelectual e política do país, alguns nomes são figurinhas carimbadas, e sem dúvida alguma, o economista e escritor Rodrigo Constantino está entre eles.

Presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Liberal, ele mantém um blog de enorme sucesso e também escreve regularmente para uma coluna na IstoÉ, além de publicar livros pela editora Record. Rodrigo é também um dos fundadores do Instituto Millenium e já escreveu para publicações como a Revista Veja e o jornal O Globo.

Em entrevista especial prontamente concedida a este Boletim, Rodrigo traçou uma análise das conquistas do movimento liberal brasileiro e, levando em conta todos os seus anos de luta no meio, apontou os desafios que ainda precisam ser enfrentados na busca do sucesso em conquistar não só a razão, mas também os corações dos brasileiros. Confira:

Boletim da Liberdade: Com bastante tempo de atuação e presença em várias frentes, você observou quase toda a trajetória de um movimento de penetração de ideias políticas alternativas no Brasil. Hoje, além das iniciativas intelectuais, liberais e conservadores se aventuram na política partidária. Em qual dessas duas esferas estamos mais avançados, e que carências apresentamos em cada uma delas na busca do sucesso?

Rodrigo Constantino: Estamos avançando em ambas, mas ainda em estágio bem inicial. A área intelectual andou mais, mas ainda falta muito para se falar num movimento liberal/conservador consistente. Acho que é preciso focar mais nesse lado, até porque sem as bases intelectuais, a política fica oca, sem embasamento, ao sabor do vento do momento. Claro que é necessário contar com gente boa e preparada na via política também, e os que decidirem se aventurar por aí merecem todo nosso apoio. Mas até por ser um liberal cético, desconfio da capacidade de o governo agir contra seus próprios interesses, e sabemos como o poder corrompe. Não sou daqueles que adotam uma postura antipolítica. Ao contrário: defendo esse caminho, pois as mudanças só virão de dentro do próprio sistema. Mas esse seria o estágio final, a ala do ataque de um time de futebol, que antes já preparou seu meio-campo, sua defesa, seus laterais e seu goleiro.

Já quanto às maiores carências, destaco a falta de infiltração na grande mídia, especialmente aquela televisiva. Precisamos de novelas com mensagens mais liberais, artistas tendo a coragem de “sair do armário” e defender o liberalismo, mais filmes e documentários com boa qualidade de produção que mostrem o lado da direita. Investir nisso me parece o foco adequado agora. Movimentos como o MBL e o Vem Pra Rua demonstraram capacidade de mobilização de massas, fomentada pela grave crise econômica e moral, mas é preciso alinhar mais a mensagem e embasar o conteúdo do que essa gente toda realmente defende e deseja. É preciso, antes, disseminar mais os valores liberais.

Sem as bases intelectuais, a política fica oca, sem embasamento, ao sabor do vento do momento

Boletim da Liberdade: Recentemente, instituições do país inteiro se articularam para criar a Rede Liberdade, em cujo primeiro evento você esteve presente. Que impressões foi capaz de colher nesse encontro e quais as perspectivas que enxerga para esse projeto?

Rodrigo Constantino: Vi com bons olhos a iniciativa, que julgo alvissareira. Mas sou realista: nós, liberais e conservadores, somos mais individualistas, trabalhamos por conta própria para sustentar nossas famílias, não aceitamos esmolas estatais, e adoramos brigar por diferenças menores, às vezes em disputas de ego um tanto infantis, apesar de humanas, demasiado humanas. Acho que pode sair muita coisa boa dessa Rede, como pautas mais alinhadas, que darão musculatura à mensagem.

Imagine vários institutos e formadores de opinião concentrando numa só semana textos e vídeos sobre um tema específico, como privatizações, o impacto que isso poderia ter. Dito isso, acho que o liberalismo vai avançar com base em iniciativas isoladas mesmo, como tem sido até aqui. Indivíduos fazem a diferença, e cada um tem suas habilidades, seu foco, seu escopo de atuação. É assim que deve ser, apesar de muitas vezes ter a sensação de esforços duplicados. A parte mais complicada, sem dúvida, é a do “fund raising”, já que batemos todos nas mesmas e poucas portas. Falta ao brasileiro uma cultura de colaborar com think tanks, investir em ideias.

I Encontro Nacional de Lideranças da Rede Liberdade (Foto: Divulgação)
I Encontro Nacional de Lideranças da Rede Liberdade (Foto: Divulgação)

Lamento, por fim, as picuinhas que percebi, especialmente de alguns mais libertários e radicais que, creio, preocupam-se mais com a sensação de “pureza” de suas ideias, em serem os “verdadeiros” defensores da liberdade, em vez de olhar para os resultados concretos de nossas ações. Não é preciso pregar um “fusionismo” com conservadores, claro, mas seria bom ter mais maturidade nos debates, principalmente quando a conjuntura em que vivemos exige isso. Basta dar um exemplo: se o Brasil tivesse mesmo virado uma Venezuela – e sem dúvida corremos esse risco na era lulopetista – de que adiantaria debater as diferenças entre liberais e conservadores, ou entre libertários consequencialistas e principialistas?

Boletim da Liberdade: Como presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Liberal, do Rio de Janeiro, poderia adiantar o que podemos esperar da instituição para os próximos anos?

Membros da equipe e colaboradores do Instituto Liberal, que tem Rodrigo Constantino como presidente do conselho, no Liberty Forum, ocorrido em Miami, em setembro. (Foto: Reprodução / Facebook)
Membros da equipe e colaboradores do Instituto Liberal, que tem Rodrigo Constantino como presidente do conselho, no Liberty Forum, ocorrido em Miami, em setembro. (Foto: Reprodução / Facebook)

Rodrigo Constantino: O IL está sob nova direção, e o foco inicial é dar mais transparência, profissionalizar o instituto, investir em sua governança. Esse é um passo necessário para que ele possa crescer, arrecadar mais recursos, inclusive no varejo. Também temos em mente elevar o nível dos debates, publicar textos com viés um pouco mais acadêmico, quando possível, sem deixar de lado os artigos voltados para um público mais amplo, mastigando a mensagem. Nossa inspiração são os institutos americanos, com mais experiência, como o Atlas Network e outros. Queremos gravar vídeos também, usar todos os instrumentos de que dispomos das redes sociais, mais baratos, para disseminar o máximo possível nossas ideias e contribuir para a formação de uma base sólida de liberais no país.

Boletim da Liberdade: Além da política e da intelectualidade, você tem se esforçado por deixar clara a nossa carência na grande mídia. Seus clamores por uma “Fox News do Brasil” já se transformaram em um bordão. O que falta para que essa iniciativa seja viabilizada e como você a enxerga?

Rodrigo Constantino: Falta algum empreendedor chutar essa bola que está quicando! Falta a iniciativa de alguém com perfil executivo que seja ousado a esse ponto, e consiga levantar recursos, organizar pessoas, liderar. A demanda existe, com certeza. Sei que quem fizer isso bem feito terá sucesso. Alguém vai fazer, alguém vai ocupar esse espaço. Ninguém aguenta mais o viés “progressista” da Globo, da Globo News, com entrevistas com socialistas o tempo todo, com eufemismos como “ocupações” para falar de invasões, com “especialistas” que vivem numa bolha e não entenderam nada do mundo real moderno.

A parte mais complicada é a do “fund raising”, já que batemos todos [institutos e formadores de opinião] nas mesmas e poucas portas. Falta ao brasileiro uma cultura de colaborar com think tanks, investir em ideias

A Fox News, com seu viés mais conservador (apesar de ser mais neutra do que as concorrentes CNN, MSNBC e CBS, que são bem de esquerda), conquistou enorme audiência, mais do que as três outras somadas. É verdade que o americano médio é mais conservador do que o brasileiro médio, mas pesquisas apontam para esse nosso viés também, ainda que menos embasado, menos enraizado. Basta pensar na questão do desarmamento: o plebiscito mostrou que a maioria defende o direito de escolha do indivíduo, para que possa ter uma arma e se defender. Mas os canais da grande imprensa costumam adotar postura diametralmente oposta, sempre batendo nesse direito básico de legítima defesa. Quem vai dar voz a essa maioria silenciosa?

Boletim da Liberdade: Vivendo nos Estados Unidos, você conhece bastante a realidade do país – inclusive, em seu último livro, Brasileiro é otário? – O alto custo da nossa malandragem, você construiu uma comparação entre os costumes e paradigmas sociais no Brasil e na grande nação do norte. Especificamente no que diz respeito a um movimento organizado de difusão de ideias liberais e conservadoras, você conseguiu observar como isso funciona nos EUA? Quais as principais lições que poderíamos aprender com os americanos nesse particular? 

Rodrigo Constantino: Em boa parte, essas diferenças que menciono no meu novo livro dizem respeito ao aspecto cultural, ou seja, são hábitos bem enraizados no povo mesmo. Não se muda isso só com bons argumentos racionais, como querem alguns liberais mais ingênuos. É preciso imaginação moral, como diria Burke, que foi um liberal antes de virar o “pai do conservadorismo”, por perceber os enormes riscos dos jacobinos revolucionários (e ele estava certo, claro). Mudar tais aspectos culturais não é nada fácil, tem ligação com nosso berço, nossa origem, nossos mitos fundadores, nossos heróis, a mentalidade disseminada, além, naturalmente, das instituições. Estas podem mudar mais rapidamente, sem dúvida. Os liberais, creio, devem mirar em ambas: cultura e instituições. Uma depende da outra para ser sólida.

Pesquisas apontam para esse nosso viés [conservador] também, ainda que menos embasado, menos enraizado

Acho que os americanos podem nos ensinar, acima de tudo, a importância desse campo dos valores, que alguns liberais ignoram, pois acham que qualquer julgamento de valor moral hoje já é coisa de conservador e reacionário. Agindo assim, acabam servindo como inocentes úteis da esquerda “progressista”. Os think tanks americanos possuem inúmeros textos fartos em dados e argumentos racionais, como deve ser, mas também batem bastante no aspecto moral, enfrentam o politicamente correto com coragem, desafiam aqueles que tentam intimidar os demais, calar o debate com base em rótulos. Há muitos canais aqui, como o Breitbart, o Dennis Prager, o The Blaze, o The Weekly Standard, o Townhall, o Daily Wire do Ben Shapiro, entre outros. Sem falar, óbvio, da Fox News, com jornalismo diário de boa qualidade sempre mostrando o outro lado, o contraditório, para um público que, antes, só tinha acesso ao pensamento hegemônico de esquerda. A lição é que existem diferentes estratégias bem-sucedidas, e quanto mais, melhor!

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