Com apenas 18 anos, Kim Kataguiri foi considerado pela revista Time, dos Estados Unidos, como um dos 30 jovens mais influentes do mundo. Hoje, aos 20, tornou-se um símbolo do novo movimento liberal que renasceu no país, além de estar entre os nomes mais influentes da nova direita. Seus vídeos, ora informativos, ora engraçados, mas sempre provocativos, já tiveram grande repercussão. Sua imagem, porém, foi projetada nacionalmente por ser um dos líderes do Movimento Brasil Livre, organização que ajudou a mobilizar milhões de brasileiros para os protestos que resultaram no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, ano passado.
Na entrevista a este Boletim, entre outras coisas, Kim se definiu como “um moleque curioso que estuda e coloca uma câmera na cara para contar suas descobertas”. A trajetória recente mostra que o moleque curioso já cativou para si algo que muitos desejam e poucos conseguem: um espaço a ser lembrado na história do Brasil. Ele fala também dos projetos do Movimento Brasil Livre, onde tem o cargo de coordenador, e anuncia ainda o lançamento de seu primeiro livro ainda este ano.
Boletim da Liberdade: 2016 certamente foi um ano vitorioso para o MBL, que conquistou muito espaço e tomou papel de destaque na organização de manifestações que levaram à queda de uma presidente da República. Qual a exata dimensão do papel do MBL nesse processo, na sua avaliação, e quais os principais méritos do movimento no ano que se encerra?
Kim Kataguiri: É difícil saber a exata dimensão de qualquer coisa quando se está no olho no furacão. O que posso dizer com certeza é que, desde o início, nós enfrentamos dificuldades enormes. A primeira manifestação que convocamos, por exemplo, foi pela liberdade de expressão — já que o Grupo Abril tinha sido vandalizado em razão da capa da revista Veja que revelou que Dilma e Lula sabiam do Petrolão — e em defesa da Operação Lava Jato. Reunimos cerca de 5 mil pessoas. No dia seguinte, a capa da Folha de S. Paulo foi “Cerca de mil pedem intervenção militar”. Não éramos “cerca de mil” e muito menos pedíamos “intervenção militar”, mas era essa a narrativa que interessava ao jornal.
Quando, depois do parecer do jurista Ives Gandra, convocamos a população para exigir o impeachment da então presidente Dilma Rousseff, apanhamos de todo lado. Ministros do governo convocaram os meios de comunicação para dizer que apenas os coxinhas da elite paulistana estavam protestando, jornais tentavam diminuir o número de manifestantes e diziam que impeachment era loucura. Para piorar, a oposição — e muito poucos se lembram disso — dizia que impeachment era golpe e que Dilma não poderia ser comparada a Collor porque é uma pessoa honrada.
Na primeira manifestação que convocamos, reunimos cerca de 5 mil pessoas. No dia seguinte, a capa da Folha de S. Paulo foi “Cerca de mil pedem intervenção militar”. Não éramos “cerca de mil” e muito menos pedíamos “intervenção militar”.
Chegamos ao ponto de andar a pé de São Paulo até Brasília, numa caminhada de 33 dias, para protocolar o pedido de impeachment e pressionar os líderes da oposição na Câmara. No caminho, eu fui atropelado junto a uma colega do movimento, a Amanda, que foi acertada em cheio e quase morreu. Tudo isso por causa da covardia dos parlamentares. Apesar do governo, da imprensa e da oposição, conseguimos. Estou escrevendo um livro com outro coordenador do movimento, Renan Santos, para contar a história do MBL e os bastidores do processo de impeachment, que sairá neste ano pela editora Record. Aliás, já era para ter saído, mas como, diferente do que esperávamos, o clima não esfriou depois do impeachment, acabamos atrasando.
Sobre os principais méritos do movimento em 2016, creio que tenha sido o fortalecimento na luta por um país mais livre, justo e próspero. Com a queda de Dilma Rousseff, demos início a debates sobre reformas estruturantes de que o Brasil sempre precisou, mas que nenhum político tinha coragem de discutir. Exemplo disso são as recentes matérias sobre as reformas trabalhista, previdenciária, tributária e a aprovação da PEC do teto — que ainda que propusesse algo óbvio, que o governo deve gastar menos que arrecada, gerou discussão por causa da resistência da esquerda perdulária. Além disso, fomos a iniciativa liberal mais bem sucedida nas eleições de 2016, com dez vereadores — sendo três deles em capitais –, dois secretários e o prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan.
Boletim da Liberdade: Depois de se tornar reconhecido como uma das principais figuras do MBL e um dos 30 jovens mais influentes do mundo, foi natural surgir um interesse pela sua vida e pelos fatores que o trouxeram até este ponto. Quem efetivamente é Kim Kataguiri e que caminho você percorreu para abraçar as ideias que defende hoje?
Kim Kataguiri: Para falar a verdade, é uma história bem banal. Nunca me interessei por política ou economia. Em casa, ninguém falava sobre esses assuntos, meu pai é metalúrgico e minha mãe é dona de casa. No último ano do Ensino Médio, quando eu tinha 17 anos, o professor de História começou a falar sobre o Bolsa Família. Dizia que tinha acabado com a miséria, diminuído a desigualdade social e até citou um estudo que mostrava que cada real investido no programa gerava tantos outros reais em crescimento do PIB. Achei aquilo maravilhoso e fui pesquisar na Internet para entender melhor a razão do sucesso do Bolsa Família. Lendo alguns artigos de economistas falando sobre o crescimento do país, vi que as coisas não eram bem como meu professor falava.
[O MBL foi] a iniciativa liberal mais bem sucedida nas eleições de 2016, com dez vereadores — sendo três deles em capitais –, dois secretários e o prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan
O país estava crescendo na onda do boom das commodities, vendendo para a China, que estava crescendo mais de 10% ao ano. Sabendo disso, é simples entender a razão pela qual o Brasil cresceu e gerou uma nova classe média. Fiz um vídeo expondo esse ponto de vista e publiquei no Youtube para que meu professor e meus colegas de sala assistissem. O vídeo começou a se espalhar e as pessoas começaram a pedir para que eu falasse sobre outros assuntos. Tomei gosto pela coisa e continuei estudando e gravando. Acho que, no fim das contas, é isso: sou um moleque curioso que estuda e coloca uma câmera na cara para contar suas descobertas.
Boletim da Liberdade: Seus vídeos costumavam ter um apelo humorístico bastante característico. Que carências você identifica na comunicação política liberal e em que pé acredita estar o movimento hoje?
Kim Kataguiri: O MBL surgiu porque o liberalismo era difundido de uma forma chata. Percebemos que o movimento liberal se resumia a palestras sobre coisas como taxa de juros, inflação e swap cambial, explicadas com uma linguagem técnica e entediante e frequentada por pessoas de gravata borboleta. É claro que não é possível fazer com que 200 milhões de brasileiros sentem debaixo de um ar condicionado para ficar ouvindo palestras sobre Economia. A comunicação, então, é o nosso principal foco desde o início. O conteúdo já é muito bem produzido por diversos institutos liberais brasileiros, nossa questão é a forma. Produzimos conteúdo liberal engajante e fácil de se assimilar. Não basta a pessoa entender, ela tem de gostar e sentir vontade de participar do que está sendo difundido. Além disso, aproveitamos a decadência da imprensa tradicional para noticiar os principais acontecimentos políticos a partir da nossa perspectiva. Hoje, nossa página no Facebook alcança em média 12 milhões por dia, mais do que o dobro do alcance das páginas da Folha, da Globo e do Estadão somadas.
O MBL surgiu porque o liberalismo era difundido de uma forma chata. A comunicação, então, é o nosso principal foco desde o início. O conteúdo já é muito bem produzido por diversos institutos liberais brasileiros, nossa questão é a forma. Produzimos conteúdo liberal engajante e fácil de se assimilar.
Boletim da Liberdade: Em relação ao meio jornalístico, como surgiu o convite para escrever para a Folha de São Paulo? Qual, na sua opinião, a importância de ocuparmos espaço nos veículos jornalísticos de grande circulação, diante das distorções que infelizmente temos o hábito de verificar na grande imprensa?
Kim Kataguiri: Não esperava o convite da Folha. Um dia, o secretário de redação do jornal me ligou e perguntou se eu tinha interesse em escrever uma coluna semanal. Perguntei se eu poderia bater na Folha. “Claro, quando quiser”, ele respondeu. Topei. Acho que o que é realmente importante é desmascarar as notícias enviesadas que são vendidas como imparciais. Os grandes veículos estão caindo cada vez mais em descrédito. Vale mais a pena criar seu próprio blog, página no Facebook ou canal no Youtube. Hoje, as pessoas buscam mais informação nas redes sociais do que na imprensa tradicional.
Boletim da Liberdade: Há alguma novidade que gostaria de anunciar? Como você enxerga o futuro do MBL?
Kim Kataguiri: O MBL vai continuar com seu trabalho enquanto movimento de rua e estrutura suprapartidária. Em 2017 planejamos pressionar prefeituras, governos estaduais e o governo federal a adotar medidas de austeridade. Além disso, participaremos dos debates sobre as reformas da previdência, tributária e trabalhista. Para 2018, o plano é eleger uma bancada liberal de pelo menos 15 deputados federais e apoiar um candidato à presidência que esteja de acordo com os nossos valores. Quem é essa pessoa? Ainda não sabemos. Com o fim da polarização PT x PSDB, as eleições de 2018 são absolutamente imprevisíveis.
Para 2018, o plano é eleger uma bancada liberal de pelo menos 15 deputados federais e apoiar um candidato à presidência que esteja de acordo com os nossos valores. Quem é essa pessoa? Ainda não sabemos.