Um advogado apresentou na última segunda-feira (22) um ofício ao Tribunal Superior Eleitoral para que a União Democrática Nacional, mais conhecida como UDN, fosse recriada. A legenda era o principal partido de direita do Brasil durante a República Nova (1946-1964) e funcionou de 1945 até outubro 1965, quando foi extinta pelo AI-2. [1]
Na peça, o impetrante solicita não o registro de um novo partido, mas a anulação dos atos institucionais do regime militar. Na sequência, a UDN deveria voltar a existir – e sem a necessidade de recolher as assinaturas e cumprir os trâmites burocráticos para a criação de um novo partido. Ele pede ainda que seja convocada uma “convenção geral” para a legenda para que novos órgãos de direção possam ser eleitos e tocarem o recomeço.
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Presidente da Juventude da UDN entre 1963 e 1965, Pedro Ernesto Mariano de Azevedo conversou com o Boletim da Liberdade sobre a notícia.
Salientando que “nenhum membro de sua época faz parte da movimentação da volta ao partido”, Azevedo afirmou, contudo, que a volta “faz sentido” – mas desde que para manter o programa original.
“O antigo programa da UDN abordava todos os temas de interesse nacional, e não apenas ‘como são os atuais partidos, que cada um defende o interesse próprio de cada líder partidário ou grandes interesses econômicos”, afirmou.
Perguntado pelo Boletim se a UDN original apoiaria o governo Bolsonaro, o ex-presidente da juventude afirmou que “provavelmente”, desde que seguisse na linha do programa do partido.
“A UDN não tinha nada contra os militares e a nossa candidatura a presidente comprova isso, quando lançamos o Brigadeiro Eduardo Gomes”, complementou, referindo-se às eleições de 1945. Na ocasião, Eduardo Games, que era Brigadeiro da Aeronáutica, obteve 34,74% dos votos, perdendo para Eurico Gaspar Dutra, do PSD, que era Marechal do Exército.
A UDN
Fundada no dia 7 de abril de 1945, a UDN apresentou um programa à Justiça na época organizando suas ideias em 14 capítulos.
Parte delas reúnem pautas liberais, como a abertura ao capital estrangeiro para o desenvolvimento do Brasil e a redução de impostos, especialmente para a classe média.
Outros aspectos, contudo, lembram partidos de viés nacionalista, destacando-se pela pregação da intervenção do Estado na economia e cessão de vantagens ao funcionalismo.
O programa fala, por exemplo, que “indústrias estratégicas ficarão a cargo do Estado ou de empresas organizadas com a sua orientação”, e cita a necessidade de se impor tarifas de proteção industrial para favorecer a matéria-prima nacional.
No que tange aos recursos minerais do Brasil, a UDN propunha também ampla intervenção: a exportação só seria permitida caso excedessem as necessidades da “indústria nacional organizada”, sem especificar. [4]
Em relação ao funcionalismo público, que apresenta no século 21 as principais distorções a serem resolvidas na reforma da Previdência, a UDN não escondia a defesa de privilégios.
No próprio programa, o partido era claro em “conceder ao funcionalismo público maiores direitos e vantagens”, apontando a importância de “bem remunerar” os servidores, sem especificar em nenhum momento a preocupação de manter um padrão salarial dos funcionários públicos similares aos do mercado.
Na pauta da educação, a UDN não escondia seu viés conservador. Seu programa falava em “adotar uma política de costumes que coíba os vícios e males dissolventes da nossa formação moral”.
Um partido de contradições
Segundo a Centro de Pesquisa e Documentação Histórica da Fundação Getulio Vargas, a UDN vivenciou em sua trajetória “contradições e cisões”. [2]
“Coexistiram na UDN teses liberais e autoritárias, progressistas e conservadoras. O partido que vota a favor do monopólio estatal do petróleo (1953) e contra a cassação dos mandatos dos parlamentares comunistas (1947) é o mesmo que se opõe à intervenção do Estado na economia, denuncia a ‘infiltração comunista’ na vida pública e contesta os resultados quando perde as eleições”, diz o verbete do acervo histórico do CPDOC.
Segundo a FGV, o udenismo apresentou três fases no Brasil: a primeira, marcada pela “oposição sistemática a Getulio Vargas”; a segunda, moralista, com denúncias de corrupção administrativa; e a terceira e última do “anticomunismo radical”, que acabou propiciando o apoio à intervenção militar de 1964.
Ironicamente, menos de dois anos depois, o regime militar que começou apoiado pela UDN impôs o ato institucional nº 2, que marcou a morte institucional do partido. [3]
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