*Por Douglas Sandri
Nesta segunda-feira (22), O Globo traz uma reportagem especial sobre a Argentina. A classe média busca válvulas de escape fora do país. Nossos vizinhos vivem novo êxodo em função da crise financeira que coloca a Argentina na lona. Analistas indicam que a decepção ocorre após o fracasso do ex-presidente Maurício Macri na promoção de reformas liberais, o que propiciou o retorno da esquerda peronista à Casa Rosada, com suas pautas estatizantes, intervencionistas e atrasadas. A profunda recessão se soma à crise sanitária numa “pandemia de desilusão”.
Ao olhar para este cenário, noto que o populismo, a falta de pulso firme nas reformas e o estatismo são âncoras que puxam uma nação para o fundo do poço econômico. No Brasil, foi em reação a essa agenda do atraso que em 2018 competiram entre si forças políticas distintas para corresponder a uma plataforma que valorizava a liberdade econômica, a livre iniciativa e a redução do tamanho do estado. Uma proposta para fazer com que um gigante como o Brasil acordasse de seu berço esplêndido, onde repousa entorpecido pelas amarras da burocracia e ineficiência de um estado grande e falido.
Foi com esse discurso econômico que Jair Bolsonaro se elegeu. Porém, mais de dois anos depois, o presidente mostra que pretende seguir pelo mesmo caminho de Macri com o atraso de reformas importantes, como a administrativa e a tributária, e as PECs Emergencial e do Pacto Federativo, para equilibrar as contas e auxiliar os estados. O governo também mostra relutância e discurso conflitante em relação à privatização de estatais como Petrobras, Eletrobrás e Correios, entre tantas outras.
O ex-capitão do Exército — que sempre demostrou uma veia corporativista em sua atuação parlamentar, mas parecia ter se convertido ao liberalismo na dobradinha com Paulo Guedes — agora interfere na Petrobras ao despejar o presidente da petrolífera, Roberto Castello Branco, e instalar um general em seu lugar, Joaquim Silva e Luna. Tudo para baixar o preço dos combustíveis. Uma medida imediatista, tomada no calor do momento, que tem potencial de causar danos ainda maiores. No presente, a depreciação das ações da Petrobras, e no futuro, com um sinal de que o governo vai abandonar de vez a sua plataforma reformista e modernizadora do estado em nome de supostas saídas que, na verdade, nos colocaram de frente ao abismo econômico e social.
Essa nova fase de Bolsonaro — com uma reedição de condutas fracassadas durante a gestão Dilma Rousseff — mostra um governo desvirtuado na economia. Não podemos ter medo de avançar. Não basta apenas ter um ministro da Economia e uma equipe liberal; tem que colocar os operadores políticos do governo a produzir resultados nesse sentido. Caso contrário, o presidente pode alienar uma parcela significativa e influente de seus eleitores — ávidos por mudanças que propiciem um melhor ambiente de negócios —, e com a escalada da crise econômica, sem estabilidade política e reformas estruturais, perder tração eleitoral.
Na Argentina, essa falta de ação no governo Macri, com quem Bolsonaro buscou uma associação, foi fatal para as suas pretensões de um segundo mandato. Esta enveredada de Bolsonaro, ao desprestigiar a agenda liberal de Paulo Guedes, deve acender um sinal de alerta. A eleição de Macri em 2015 serviu de antecipação à guinada à direita no Brasil, que culminou na eleição de Bolsonaro.
O caso de nossos hermanos deve servir de exemplo da necessidade de resiliência com relação às pautas liberais que elegeram os governos daqui e de lá. Não podemos esquecer — jamais! — que o populismo, o gradualismo e o estatismo são antessalas para o retorno de um governo esquerdista ao Palácio do Planalto.
*Douglas Sandri é assessor parlamentar na Câmara dos Deputados
Foto: Reprodução/Arquivo pessoal.