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Democracia à cubana

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Cuba é uma ditadura porque o maior país democrata do mundo erra nas estratégias de relacionamento com a Ilha. O bloqueio é apenas uma peça, um elemento, só o símbolo das diversas oportunidades perdidas. Tomara não estejamos diante de mais uma.

O grito do povo cubano nas ruas, nos últimos dias, não é pela democracia, porque ela impõe a liberdade como premissa. Os cubanos foram às ruas para implorar por comida e pela chance de sobreviverem ao massacre do Covid-19. Se forem felizes nisso, compreenderão que a liberdade é a alternativa para enquadrar os agentes do Estado. Caso não, manterão a chama acesa para que a fuga do país deixe de ser a única chance de uma sobrevivência digna. Pode demorar, mas a chama da liberdade está posta no coração do povo.

Lembro-me de uma das lições de Sócrates, quando lhe perguntaram: “Será que amarrado para ouví-lo, Sócrates, alguém que não pára para aprender com você, aprenderá?”. Ele respondeu: “Minha mãe era uma parteira, uma magnífica parteira, mas não conseguia ajudar uma mulher a dar à luz se ela não estivesse grávida”. O povo cubano engravidou-se com a noção de liberdade, como aconteceu com o povo da Venezuela. Resta saber qual o tempo de gestação.

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“Se não há contraste inexiste consciência”, diz a filosofia. Os cubanos que permanecem em Cuba não conheciam os benefícios da liberdade política, portanto, sequer sonhavam com o que é a democracia. A fome e a morte, neste momento, levaram a liberdade a fazer algum sentido na vida dos cubanos.

Os cubanos andavam cansados de buscar a independência e muitos deles ainda acreditam que o mundo é aquele que eles conhecem. Cuba ficou anos nas mãos da Espanha, depois dos EUA, sem seguida, da União Soviética, e agora subordinada à caridade de um tirano instalado à força na Venezuela.

A democracia é um processo, um avanço da liberdade, que não se atém ao campo econômico como pretende provar a China. Vai além. Chega à liberdade do indivíduo para decidir sobre o que é melhor para si e em condições de defender que esse seja um direito de todos.

Os EUA conhecem bem o benefício da democracia, mas deixam a notícia na história de a desejarem só para si. Pelo menos o que transparece quando, em nome dela, intrometem-se em outros lugares.

A conquista da liberdade de um povo começa quando um indivíduo ou vários indivíduos prezam por ela e a querem para os demais, um processo de libertação que Platão descreve de forma magnífica no Mito da Caverna. O roteiro entregue por Platão é didático e profundo. Ele vai da escravidão inconsciente à consciência de liberdade e, por conseguência quase natural, à necessidade de ajudar a humanidade a conhecê-la para ser livre. Os mitos desaparecem à luz do sol, à luz da liberdade, mostra Platão.

A cubana Yoani Sánchez, liberta das correntes da caverna, esteve no Brasil em fevereiro de 2013, início do terceiro ano do governo de desordem com odor socialista da Dilma Rousseff. A jornalista foi chamada de blogueira pelos colegas brasileiros amantes de Fidel, talvez, para diminuírem a importância de sua pregação. Yoani esteve no Roda Viva, apresentado naquele tempo pelo “fidelista” Mário Sérgio Conti.

Pressionada a assumir o papel de elemento de prova de que em Cuba existe sim alguma liberdade e, por isso, não haviam manifestações como no mundo árabe, ela respondeu: “A maioria dos jovens cubanos, quando se sente asfixiada pelo sistema, pelo controle, pela falta de projeções de prosperidade e futuro, prefere migrar a ficar. Eles expressam a rebeldia saindo do país. Existe uma frase que eu gosto”, disse ela: “Meus compatriotas preferem mostrar a sua valentia, enfrentando um tubarão no Estreito da Flórida para migrar, a enfrentar uma repressão nas ruas”. Imaginem o que é a repressão em Cuba! E ela continua: “Isso é uma válvula de escape do desejo de rebeldia”.

Uma sucessão de erros de estratégia de comunicação dos EUA com o povo cubano mantém a ditadura na Ilha. O bloqueio é só mais uma representação do fato.

Os norte-americanos tiraram os espanhóis da Ilha em 1898 e humilharam os cubanos com o acordo de paz assinado em Paris. Engessaram a economia cubana com uma emenda – a Emenda Platt – anexada à Constituição Cubana. Por ela, os cubanos perderam a autonomia econômica. Os norte-americanos governaram Cuba indiretamente e com muita influência até a entrada triunfal de Fidel e Che Guevara no País.

Com Fidel Castro, os EUA optaram pelo bloqueio comercial. Cuba, então, entregou-se definitivamente à União Soviética, a besta do Apocalipse, o monstro comunista.

Adiante, o comunismo desmoronou, alí esteve presente uma oportunidade para os EUA. Se derrubasse o bloqueio, teria mostrado aos cubanos que o capitalismo era a alternativa. Mas, não! Manteve-se a estratégia da humilhação. A intenção ainda era conquistar pela submissão e a democracia detesta isso!

Depois, Fidel se afastou doente em 2008 e entregou o poder ao irmão. Nasceu uma nova oportunidade para os americanos retirarem o bloqueio e conquistarem a simpatia dos cubanos. Obama tentou isso dez anos depois, em 2016. Mas, veio Trump e manteve os cubanos acorrentados no interior da caverna. Os que conseguissem fugir teriam dificuldades maiores ainda para chegar à liberdade.

Mas, nem toda a esperança do bom uso da estratégia pelos EUA estará perdido na relação com Cuba se o Presidente Joe Biden levar adiante o que prometeu durante a entrevista coletiva, que concedeu em companhia da chanceler alemã, Angela Merkel, fato noticiado pelo Boletim da Liberdade na sexta-feira.

Ele disse que poderá ajudar o povo cubano a recuperar o acesso à internet, sem depender da autorização do governo cubano. É quando eu retorno à entrevista da jornalista Yoani Sánchez, no resto da explicação que ela deu aos colegas representantes da esquerda brasileira sobre a ausência de manifestações populares em Cuba naquele tempo: “Outro elemento é a tecnologia”, disse ela. “Na África do Norte, a tecnologia cumpriu uma função muito importante. As redes sociais e os telefones celulares foram fundamentais. Em Cuba, o acesso à internet é muito limitado. O acesso a celulares custa muito. Então, ainda não está criada a rede de acesso ou difusão daquele material de inconformidade e crítica chamado às manifestações”. Uma profecia de 2013, cumprida em 2021.

Sem precisarem usar os marines usados em 1898, para invadir Cuba, e dispensando os ditadores que protegiam durante algum tempo na Ilha, os americanos podem agora entregar aos cubanos um bom motivo para conquistarem a liberdade e, adiante, a democracia.

Não quero terminar, já que o assunto é Cuba, sem sugerir a vocês a leitura do artigo do Fernando Schüler, “A Ilha do Absurdo”, publicado na edição da VEJA desta semana.

Boa semana para vocês.

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Aviso

As opiniões contidas nos artigos nem sempre representam as posições editoriais do Boletim da Liberdade, tampouco de seus editores.

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