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“Taiwan não deve tornar-se a Ucrânia da Ásia” diz Diego Wen

As consequências de uma invasão chinesa de Taiwan seriam muito maiores do que as da guerra na Ucrânia. É isto que o representante de Taiwan no Brasil, Diego Wen, explica numa entrevista ao Público

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“Taiwan não deve tornar-se a Ucrânia da Ásia, seria devastador” para o mundo, adverte o chefe do Escritório Econômico e Cultural de Taipei no Brasil. Por este motivo, salienta que a comunidade internacional deve “deter os regimes totalitários” e impedi-los de agir com violência contra a Ilha.

 

Na ilha de Taiwan, antiga Formosa, os interesses das grandes potências colidem. A sua posição geoestratégica no Mar do Sul da China e a sua liderança mundial na produção de semicondutores com tecnologia de ponta, essencial para as telecomunicações, transportes e indústria global, colocam este território como um dos pontos quentes do planeta e no olho do furacão de tensões entre a China e os Estados Unidos.

 

Mesmo sem reconhecer oficialmente a sua independência da China, Washington constituiu-se como o firme defensor de Taiwan e prometeu o seu apoio militar caso Pequim tentasse invadir a ilha, como alguns altos funcionários militares norte-americanos indicaram que acontecerá nos próximos anos.

 

Separado da China comunista em 1949, quando o governo nacionalista chinês se refugiou em Formosa, face ao avanço do Exército Vermelho de Mao Tse Tung, Taiwan tem sido durante décadas um dos epicentros da Guerra Fria. O governo de Taipei procura o reconhecimento internacional para impulsionar ainda mais o seu “milagre” económico e garantir a sua segurança. Vale a pena lembrar que Taiwan não é considerado um Estado independente pela grande maioria da comunidade internacional.

 

P: A China reforçou a sua força naval e presença militar no Mar do Sul da China e nas proximidades de Taiwan. Os EUA e os seus aliados japoneses também responderam com manobras e com a reorganização das suas forças armadas no Pacífico Ocidental. Qual é a situação no Estreito de Taiwan?

R: Em 2022, registámos 3.445 incursões de aviões militares chineses em Taiwan. Usando como pretexto a visita a Taiwan da então Presidente da Câmara dos Representantes dos EUA Nancy Pelosi, em Agosto último, a China começou os exercícios militares ao vivo em torno de Taiwan e os aviões militares chineses começaram a atravessar a linha média do Estreito de Formosa. A China está a tentar fazer disto uma situação de business as usual e assim estabelecer um “novo normal” que é uma alteração unilateral do status quo no Estreito. Em suma, trata-se de um desafio à ordem internacional.

 

Nós, taiwaneses, não podemos comprometer a soberania territorial, a democracia e a independência; e acreditamos que o conflito militar não é uma opção. Como a nossa Presidente Tsai Ing-wen afirmou, estamos dispostos a trabalhar com a China, sempre sob os princípios da racionalidade, igualdade e respeito mútuo, para encontrar uma solução mutuamente aceitável que mantenha a paz e a segurança no Estreito de Taiwan.

 

P: Poderia a visita de Pelosi ter sido evitada para não inflamar as tensões entre Pequim e Taipei?

R: Qualquer amigo internacional que queira visitar Taiwan é bem-vindo. Não podemos recusar a visita de um amigo. Nancy Pelosi foi a terceira na linha de sucessão do Governo dos EUA. Foi por isso que a acolhemos. Há uma coisa que não podemos compreender: porque é que a China continental, a China comunista, usou esta visita como desculpa para aumentar a tensão? Não é justo. É uma tensão unilateral.

 

P: Existem canais de comunicação entre Pequim e Taipei para evitar uma escalada incontrolável?

R: Existem duas associações semi-oficiais em ambos os lados do Estreito: a Associação para as Relações no Estreito de Taiwan, do lado chinês, e a nossa, a Fundação para o Comércio no Estreito. Além disso, o nosso governo tem um Conselho para os Assuntos do Continente, que gere a política relacionada com o Estreito de Taiwan. Mas se uma coisa é clara para nós, taiwaneses, é que não podemos aceitar o diálogo com base em intimidações e ameaças, incluindo o uso da força.

 

De acordo com um recente inquérito conduzido pelo governo de Taiwan, quase 90 por cento dos taiwaneses expressam a sua oposição à declaração feita pelo Presidente chinês Xi Jinping no 20º Congresso do Partido Comunista Chinês em Outubro de 2022. Xi voltou a sublinhar que a China não renunciará ao uso da força para reunificar Taiwan.

 

Além disso, 83,9% desaprovam a abordagem da China à resolução da questão de Taiwan; 82,3% opõem-se à insistência da China no “consenso de 1992” no âmbito da política de “uma só China”; e cerca de 80% opõem-se à fórmula de reunificação “um país, dois sistemas”, que falhou em Hong Kong.

 

P: Como está Taiwan a lidar com a crise internacional resultante primeiro da covid-19 e depois da guerra na Ucrânia?

R: No seu discurso de Ano Novo, a nossa presidente, Tsai Ing-wen, identificou como seus objectivos a defesa da segurança nacional, a manutenção da dinâmica económica e o reforço do bem-estar público. Ela reconheceu que a invasão russa da Ucrânia e a inflação global causaram uma instabilidade económica e financeira drástica em todo o mundo. O nosso governo está, portanto, a trabalhar em medidas para responder à pressão inflacionista contínua e para tentar mitigar o risco de um abrandamento económico.

 

P: O povo de Taiwan teme as consequências humanas e económicas de uma possível invasão militar por parte da China?

R: O impacto seria muito maior, razão pela qual a comunidade internacional precisa de trabalhar em conjunto para evitar que Taiwan se torne a Ucrânia da Ásia.

 

Não esqueçamos também que Taiwan é o principal fornecedor global e um actor chave na cadeia global de fornecimento de chips, com 63% do mercado mundial. Numa entrevista à televisão CBS a 25 de Setembro de 2022, o Secretário de Estado norte-americano Antony Blinken advertiu que se esta cadeia de abastecimento fosse perturbada, os efeitos sobre a economia global seriam devastadores.

 

P: Na sequência de tensões com potências como a Rússia e a China, qual é a sua opinião sobre a situação global?

R: Numa carta recente ao Papa Francisco, o nosso Presidente Tsai Ing-wen salientou que a guerra na Ucrânia reforçou o valor da paz e que a preservação da segurança regional se tornou um consenso fundamental partilhado pelos líderes mundiais.

 

A existência de regimes hegemónicos e autoritários, como a Rússia e a China, agindo de forma semelhante, mostra-nos a necessidade de os países democráticos trabalharem em conjunto para os deter e assegurar a paz mundial. Felizmente, nós em Taiwan temos um apoio internacional cada vez mais forte, como os nossos aliados, sobretudo os Estados Unidos e a União Europeia, estão a demonstrar dia após dia.

 

O Parlamento Europeu sempre demonstrou um apoio claro e inequívoco a Taiwan, aprovando um total de 25 resoluções favoráveis nos últimos dois anos. Em Janeiro de 2023, adoptou mais duas, condenando as contínuas provocações militares da China e apelando a que as disputas entre Pequim e Taipei fossem resolvidas através de um diálogo pacífico sem condições prévias.

 

P: Então espera receber mais apoio internacional para a sua participação em organizações internacionais este ano?

R: A pressão da China para nos impedir de participar em organizações internacionais é mais um exemplo da hegemonia que pretende impor à comunidade internacional, razão pela qual, insisto, o regime de Pequim deve ser travado no seu caminho.

 

P: E qual seria a forma de evitar um eventual confronto militar com a China?

R: Tem de haver diálogo e tem de haver sob os princípios da racionalidade, igualdade e respeito mútuo para se encontrar uma solução mutuamente aceitável que mantenha a paz e a segurança no Estreito de Taiwan. Até agora, estamos à espera da resposta da China continental.

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