*Por Sara Ganime
A agitação em torno do filme da Barbie é gigante, mas nem se compara ao que o enredo, de fato, representa. Quando eu era criança, eu não tive barbies. Muito porque minha mãe não gostava da ideia de uma boneca com um estilo mais adulto. Mas também pelo fato de ser um brinquedo cheio de estereótipos, os quais nunca fui. Mas assisti a muitos filmes da Barbie, e sem parar. Vi a Barbie bailarina, Barbie princesa, Barbie plebéia, Barbie estudante, sereia, estilista. Fez parte da minha infância. Da minha e das minhas irmãs.
O filme não é um conto de fadas em que a Barbie é a salvadora da pátria. Mas também não deixa de ser. O roteiro traz a “Barbieland”, terra onde vivem todas as Barbies e os Kens. É a definição de vida perfeita, na qual a Barbie realmente acredita que sua própria existência resolveu os problemas das mulheres da “vida real”, mais conhecida como o que a gente vive por aqui. Até que essa perfeição cai por terra e Barbie precisa dar um pulinho na vida real e vê que as coisas são bem diferentes do que imaginava.
É claro que, ao longo dos anos, a marca Barbie deixou de ser o que muitas mães como a minha enxergavam. Ela deu passos de representatividade. Apresentou Barbies negras, Barbies com deficiência, a Barbie presidente, astronauta e muitas outras coisas. Mas sem deixar de lado a Barbie clássica, que divertiu e ainda diverte muitas crianças. E isso faz parte de uma autocrítica que a Mattel traz durante o filme.
Recentemente, saiu uma notícia de que cristãos têm alertado a não levar seus filhos para assistirem Barbie por uma agenda progressista. Não acho que seja um filme infantil, mas não por agenda progressista. Acho que não é um filme infantil porque os diálogos são muito profundos, talvez adultos demais para emocionar uma criança.
Mas existe sim uma agenda feminista. Em alguns momentos, o roteiro chega a usar demais a palavra patriarcado. Mas eu juro que é de um jeito super divertido e nada pedante. Toda a história é entregue de um jeito muito leve e fluido. A Barbie não resolveu todos os problemas das mulheres do mundo. E nem poderia. Ela é uma boneca, um alívio cômico. A Barbie não é uma política social. É um brinquedo.
Quando saiu a notícia de que existiria um filme da Barbie em live-action eu não consegui suportar essa ideia. Esse vício moderno dos estúdios de quererem transformar em pessoas reais os desenhos que tivemos me dá nos nervos. Até a Warner anunciar Greta Gerwig como diretora do filme. Ali tudo mudou. Greta é talentosíssima. Conta histórias de um jeito bonito, com seu humor sarcástico e valorização das mulheres. Não à toa já recebeu três estatuetas de Oscar, e espero que Barbie traga mais um para ela.
*Sara Ganime é jornalista de cinema, apresentadora do podcast cineaspectos e editora-chefe do Boletim da Liberdade