Alexandre de Moraes (STF) determinou que o governo federal apresente um plano nacional para a população de rua em 120 dias. O ministro protocolou a medida cautelar no dia 25 de julho. Ele alega omissão do Executivo e Legislativo ao longo do tempo na implementação de políticas para quem vive nas ruas do país. A referência é um decreto presidencial de 2009.
A decisão de Moraes partiu de uma ação que corria no Supremo pela Rede Sustentabilidade, pelo PSOL e pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O argumento gira em torno do “estado de coisas inconstitucionais concernente às condições desumanas de vida da população em situação de rua no Brasil”.
Segundo a medida, a situação precária vivida pela população em situação de rua decorre de omissões estruturais e relevantes do poder público. Sobretudo atribuíveis ao Poder Executivo, mas também ao Poder Legislativo, em razão de lacunas na legislação e de falhas na reserva de orçamento público.
E o princípio da independência?
Ao protocolar a medida, o STF atropelou o Executivo e Legislativo, acentuando mais uma vez a violação ao princípio da independência entre os poderes. Moraes ensaia um atentado contra a Constituição, como comenta a jurista Kátia Magalhães. “O tema é tão delicado quanto segurança pública e educação, assuntos pertinentes ao Executivo, e nos quais o STF se intrometeu recentemente. A decisão está bem em linha com julgamentos anteriores do Supremo sobre matérias que competem a um outro poder”.
Segundo Kátia, a medida de Moraes significa um desequilíbrio entre os poderes. “É uma sinalização do Judiciário, já classificado pelo próprio Ministro Barroso como um “poder político”, de que a última palavra em qualquer assunto cabe a ele (Judiciário). Enxergo como uma fragilização política do Executivo, e mais uma prova de força do Supremo”.
De acordo com o advogado Rodrigo Veiga a atuação é bastante polêmica. Ele considera que a decisão do ministro pode ter ultrapassado a competência do Poder Judiciário. Isso porque substituiu os poderes que são competentes para formular e executar políticas públicas. “Tanto é que a Advocacia Geral da União (AGU) e a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestaram suscitando a inadequação do processo. Pois, de forma transversa, o Judiciário estaria extrapolando sua função e invadindo esfera de competência da União para coordenar e editar políticas públicas sobre o tema, bem como estaria criando despesas públicas sem a devida previsão orçamentária, função típica do Poder Legislativo”.
Extrema urgência
A decisão determinou o cumprimento das medidas no prazo de 120 dias, porém a Lei 9.882/99, que rege a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), impõe que a maioria absoluta do tribunal poderá conceder a medida liminar. Nesse sentido, o relator utilizou-se da exceção prevista que possibilita que, em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave, o relator pode conceder a medida liminar, “ad referendum” do Tribunal Pleno. Ou seja, a decisão ainda precisa do referendo do Tribunal Pleno, com análise dos demais ministros, explica Veiga.
A princípio, esse ato está deve ocorrer entre os dias 11 e 21 de agosto, quando o Tribunal Pleno do STF analisará se a medida deve ou não prevalecer. Dessa forma, também é questionável a concessão da liminar, pois, à princípio, não parece que o caso se adeque à exceção legal de extrema urgência ou perigo de lesão grave, já que o Decreto Federal que instituiu a Política Nacional é de 2009 e a situação perdura desde então, com alguns entes que já demonstraram adesão à Política.
“Não parece haver a urgência excepcional que justificasse a concessão de medida de forma liminar, pelo Relator, substituindo a manifestação do Tribunal Pleno”, ressalta o advogado.