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Panorama Jurídico – Nº 004 – 25/08/2023

Os principais fatos jurídicos da semana, o que está acontecendo de mais importante nas cortes brasileiras, com a opinião de juristas renomados, em uma linguagem simples e direta
Panorama Jurídico

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Por Kátia Magalhães*

STF oficializa a “república dos parentes”

Por maioria, o tribunal acolheu ação movida pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), e revogou norma que impedia juízes de apreciarem causas patrocinadas por escritórios de seus parentes. Embora os nomes dos advogados constem nas capas dos processos e nas procurações apresentadas nos autos, o Ministro Zanin afirmou ser “praticamente impossível para o magistrado conhecer a carteira de clientes do escritório no qual atua seu parente”, enquanto o Ministro Gilmar Mendes considerou a regra questionada uma “cláusula excessivamente abrangente”.

A partir da decisão, bancas comandadas por esposas, filhos, e demais familiares de togados das mais diversas instâncias e regiões poderão manter ações sob os cuidados de seu parente magistrado, sem receio de alegação de impedimento pela parte contrária. Mais que nunca, o vínculo parental com togados será fator determinante de êxito na advocacia privada.

TRF-1 absolve Dilma das “pedaladas fiscais

Em votação unânime, foi mantido o arquivamento da ação do MPF contra a ex-presidente por maquiagem de resultados fiscais, e ocultação de crise iminente em seu governo. Na decisão, baseada em entendimento do Supremo sobre a Lei de Improbidade Administrativa em vigor, os julgadores ratificaram os argumentos da defesa de Dilma de que não teria havido “evidência de sua intenção de participar efetivamente desses atos.” Também foram beneficiados pelo TRF-1 o ex-Ministro Guido Mantega, o ex-presidente do BB Aldemir Bendine, o ex-secretário do tesouro Arno Augustin e o ex-presidente do BNDES Luciano Coutinho.

A despeito da decisão, a prática das “pedaladas” já havia sido constatada pelo Congresso, e caracterizado crime de responsabilidade de Dilma, tendo motivado seu afastamento em 2016. Os votos dos desembargadores não apagaram da nossa História nem a regularidade do processo de impeachment contra a ex-mandatária, nem os malfeitos da sua gestão.

Delgatti é condenado pelo vazamento de conversas da Lava-Jato

Em sentença que condenou o hacker a 20 anos de prisão, o juízo da 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal concluiu pela responsabilidade de Walter Delgatti por diversos crimes, dentre os quais os de organização criminosa, lavagem de bens e invasão de dispositivo informático alheio. Famoso desde o vazamento de supostos conteúdos de celulares de autoridades e agentes públicos como Sérgio Moro e procuradores da Operação Lava-Jato, Delgatti costumava concentrar seus ataques cibernéticos em “agentes responsáveis pela persecução penal”, como destacado pelo magistrado do DF.

“Singularidade nacional” será continuar vendo o uso, pela cúpula judiciária, de mensagens objeto dos crimes praticados pelo agora condenado Delgatti, como se fossem provas lícitas. Coisa nossa.

Moraes e os “empresários do Whatsapp

Um ano após abertura de investigação contra empresários por suposta apologia a golpe de estado em grupo de Whatsapp, o Ministro Alexandre de Moraes arquivou o inquérito contra os investigados Afrânio Barreira Filho, José Isaac Peres, José Koury Junior, Ivan Wrobel, Marco Aurélio Raymundo e Luiz André Tissot, por ter entendido que a apuração carecia “de elementos indiciários mínimos” para sua continuidade. Demorou.

No entanto, manteve em aberto as investigações sobre Luciano Hang e Meyer Nigri, e intimou o ex-presidente Bolsonaro a depor no chamado “caso dos empresários”. Por aqui, conversar e opinar, até em ambientes privados, viraram atividades de alto risco.

O STJ e mais redução de pena para tráfico privilegiado

Primariedade, bons antecedentes e ausência de elos com organizações criminosas autorizam a redução de penas de condenados por narcotráfico. Esse foi o entendimento aplicado, de ofício, pelo Ministro Ribeiro Dantas a preso condenado com 11,7 gramas de maconha e 12,7 gramas de cocaína, em Santa Catarina. Apesar das provas examinadas pelo tribunal local catarinense sobre prática reiterada de narcotráfico, o que já tinha custado ao réu uma prisão anterior, ainda assim o togado do STJ decidiu minorar a pena, reduzindo-a de 5 anos para 1 ano, 11 meses e 10 dias.

Mais uma decisão de corte superior que suaviza punições contra narcotraficantes.

Toffoli anula provas contra Vaccari

Em nova decisão monocrática, o Ministro Dias Toffoli anulou provas exibidas em ações penais contra o ex-presidente do Peru, Olanta Humalla, e contra o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Essa foi mais uma deliberação baseada na “imprestabilidade” de planilhas da empreiteira Odebrecht, que teriam perdido sua força probatória a partir das mensagens hackeadas por Walter Delgatti sobre suposta parcialidade dos então juiz e procuradores da Operação Lava-Jato.

Ambos os beneficiários da recente canetada de Toffoli são aliados políticos do presidente Lula.

O Supremo e os moradores de rua

Por maioria, o tribunal confirmou liminar do Ministro Alexandre de Moraes que, em ação movida pelo PSOL e pelo MTST, havia proibido a remoção de pessoas em situação de rua, assim como a construção, por prefeituras, de barreiras e outros obstáculos à instalação dessa população em vias públicas. Na decisão, os juízes supremos extrapolaram suas funções, tendo deixado de atuar como árbitros em litígios concretos para passarem a formuladores de políticas públicas.

No meu canal no Youtube, comentei o descabimento da liminar de Moraes, e até o possível uso político do drama dos sem-teto. https://www.youtube.com/watch?v=gqlpcxyWhys&t=898s

Clipping fere direitos autorais?

A 3ª Turma do STJ condenou, por maioria, empresa compiladora de notícias e artigos de jornais editados pela Folha da Manhã a indenizar o grupo por ter, segundo os togados, prejudicado interesses econômicos de empresas jornalísticas. Apenas o Ministro Moura Ribeiro, voto vencido, se manteve fiel à Lei de Direitos Autorais, que permite a reprodução, na imprensa, de notícias ou artigos de outros periódicos, com a devida menção aos autores e aos veículos.

A questão adquire relevância em tempos de discussão sobre o chamado PL da Censura, quando certas lideranças pretendem impor às big techs uma remuneração pela divulgação de conteúdo jornalístico, e, assim, asfixiar o ambiente digital. No aguardo dos “próximos capítulos”.

Candidato ao STJ absolve acusado de estupro de menor de 13 anos

O desembargador Airton Vieira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, votou pela absolvição de um fazendeiro de 76 anos, acusado de ter estuprado uma adolescente de 13. Em sua justificativa, o togado se baseou em condições pessoais da vítima, supostamente dedicada à prostituição e ao consumo de álcool e entorpecentes, razão pela qual, sob a ótica de Vieira, seria “crível” que o réu tivesse “se enganado quanto à real idade da vítima”.

Nada “crível”, porém, é o notório saber de magistrado que, desconsiderando a lei penal e toda a orientação dos tribunais superiores, finge não ver que a prática de relações sexuais com parceiros abaixo dos 14 é tida como violenta, sob qualquer circunstância. É presunção absoluta, sem possibilidade de flexibilização.

Após um comentário crítico a esse voto, o apresentador Tiago Pavinatto foi demitido da emissora Jovem Pan, por ter se recusado a fazer retratação junto ao desembargador. Corre, nos bastidores, que o togado paulista conta com o poderoso apoio de Alexandre de Moraes para ocupar a próxima cadeira no STJ.

Deltan colocado “debaixo de vara” por Salomão

O Ministro Luís Felipe Salomão, corregedor do CNJ, intimou o ex-procurador e deputado federal cassado Deltan Dallagnol a prestar depoimento “com urgência” na sede da justiça federal em Curitiba, sob pena de condução coercitiva. A determinação, mantida em sigilo absoluto, não informa nem a fundamentação, nem o tema da inquirição.

Por jamais ter sido magistrado, Deltan não poderia estar sujeito à esfera de atuação do CNJ. Tampouco seria o caso de ameaça de “condução”, já que os procedimentos junto ao Conselho, de caráter disciplinar, não apresentam o mesmo rigor dos processos judiciais.

E lá vai Deltan, depor não se sabe sobre o que, perante autoridade desprovida de poderes para interrogá-lo. Se vivo e a par das “novidades” do nosso Brasil, Kafka certamente lançaria uma versão bem turbinada de seu O Processo.

*Kátia Magalhães é advogada, liberal e apaixonada por arte e cultura

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