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Panorama Jurídico – Nº 008 – 22/09/2023

Os principais fatos jurídicos da semana, o que está acontecendo de mais importante nas cortes brasileiras, com a opinião de juristas renomados, em uma linguagem simples e direta
Panorama Jurídico

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Por Kátia Magalhães*

Em nova manobra contra a Lava-Jato, Toffoli “reabilita” Appio

Menos de duas semanas após sua decisão furiosa de anular todas as provas obtidas a partir do acordo de leniência com a empreiteira Odebrecht, o Ministro Dias Toffoli acaba de derrubar a suspeição do juiz Eduardo Appio. Em maio deste ano, Appio havia sido afastado do comando da 13ª Vara Federal de Curitiba devido a supostas ameaças ao filho do desembargador do TRF-4, Marcelo Malucelli. Pelo mesmo motivo, o tribunal local havia declarado Appio suspeito em todos os assuntos referentes à Operação Lava-Jato, e anulado suas decisões nos casos.

Atendendo a pedido da defesa do juiz, Toffoli tornou sem efeito a deliberação do TRF-4 que, no seu entender, teria deixado o acusado “sem qualquer oportunidade de contraditório ou ampla defesa”. O togado ainda transferiu a investigação aos cuidados do CNJ.

Appio figurou como doador da campanha eleitoral de Lula no ano passado, adotou a sigla “LUL22” como sua identificação no sistema eletrônico judicial, e anulou a condenação do ex-governador Sérgio Cabral, réu confesso em esquemas de corrupção grossa. Porém, nenhum desses graves elementos foi suficiente para manter de pé sua suspeição. Pudera. Quem decide por último é ninguém menos que o togado conhecido sob o codinome “amigo do amigo do meu pai”.

CNJ x Lava-Jato

Como resultado de investigação extraordinária na 13ª. VF de Curitiba, o CNJ reportou suposto “conluio envolvendo os diversos operadores do sistema de justiça, no sentido de destinar valores e recursos no Brasil, para permitir que a Petrobras pagasse acordos no exterior que retornariam para interesse exclusivo da força-tarefa.” O relatório, contudo, possui teor meramente especulativo, sem apoio em fatos, e sem especificação sequer sobre a natureza dos interesses dos protagonistas da LJ que viriam a ser satisfeitos.
Puro esperneio em detração à operação anticorrupção responsável por restituições bilionárias aos cofres da Petrobrás, e em prol do grupo político que, apesar da vitória eleitoral, segue ilegítimo, pois afundado no mar de lama de seus comprovados malfeitos.

Torpedos de Salomão e Dino

Vale tudo para desacreditar a LJ. Como fundamento para a investigação sobre as supostas irregularidades incorridas pelo juízo paranaense, o corregedor do CNJ, Ministro Luís Felipe Salomão, tem lançado mão das mensagens hackeadas pelo condenado Walter Delgatti.

Em paralelo, Salomão articula com o Ministro da Justiça Flávio Dino, com a AGU e o TCU a possível formação de um “grupo de trabalho”, para “verificação mais ampla das condutas objeto desta correição”. Sempre, é claro, mediante o emprego de provas obtidas por meio ilícito e de narrativas mirabolantes rotuladas como verdades.

Mais CNJ

Em decisão unânime, o plenário do CNJ afastou, e abriu processo administrativo contra o juiz Marlos Merlek do TRT da 9ª Região. Segundo o órgão, o magistrado teria proferido “ataques sistemáticos” ao STF e ao TSE no grupo de whatsapp “Empresários & Política”. A título de lembrete, trata-se do mesmo grupo ao qual tiveram acesso informantes da corte eleitoral para a abertura de investigação de ofício contra os ditos “empresários golpistas”.

Nossos tribunais superiores perderam mesmo qualquer respeito pela privacidade das conversas, e pelo legítimo direito à crítica. Enquanto endossam, até com orgulho, a afirmação de que o “Judiciário virou um poder político”. Um reino de paradoxos.

Barroso reintegra irmã de Juscelino à sua prefeitura

Por decisão monocrática do togado, Luanna Rezende foi restituída ao comando do município de Vitorino Freire (MA). Há poucos dias, a prefeita havia sido afastada do cargo, devido às suspeitas de participação em esquema de desvios envolvendo seu irmão, o atual Ministro das Comunicações Juscelino Filho. Segundo a PF, o outrora parlamentar Juscelino pode ter recebido emendas milionárias destinadas apenas à pavimentação de estrada que atravessa propriedades da família.

Embora as investigações ainda não tenham sido encerradas, Barroso entendeu que o afastamento de Luanna da prefeitura “não mais se justifica à luz do princípio da proporcionalidade”. Como a decisão se acha sob sigilo, sequer podemos avaliar os fundamentos para a definição desse timing pelo togado.

O que sabemos, ou, pelo menos, intuímos, é que, uma vez de volta à gestão municipal, a moça terá amplo acesso à documentação relativa à construção de estradas, inclusive a evidências que possam comprometê-la. Porém, a integridade das provas e até a segurança de eventuais testemunhas não parecem preocupar Barroso.

Uber condenada a pagar indenização bilionária

Relações empregatícias “não podem ultrapassar o limite do razoável”, e a liberdade de empreender “encontra limites (…) na função social da empresa”. Com base nessas premissas, a 4ª Vara do Trabalho de São Paulo condenou a empresa a arcar com R$ 1 bilhão por danos morais coletivos, e a registrar os motoristas atuantes pela plataforma. O juízo acolheu pedidos de uma ação do Ministério Público do Trabalho que pleiteava o reconhecimento de vínculo laboral entre a Uber e os condutores, assim como a condenação da empresa em suposto dano moral coletivo.

No entanto, longe da bolha togada, o que se observa é a atuação da empresa como uma das maiores geradoras de oportunidades nos últimos anos, permitindo a percepção de renda por profissionais que, de outro modo, sequer teriam como alimentar suas famílias. Para além da imbecilidade do universo da tutela estatal, outro fato inequívoco é o desejo, manifestado por 80% dos motoristas de aplicativo, de não atuarem mediante contratos de trabalho (carteira assinada).

Quem efetivamente gera danos arquibilionários à coletividade é a nomenclatura de toga, que, além de muito dispendiosa, não hesita em criar entraves à atividade empresarial, afugentando do país empresas do porte da Uber. Afinal, diante de um precedente de condenação descabida e desproporcional como essa, quem sonhará em manter seus negócios por aqui?

Relação trabalhista entre advogado e escritório

Na mesma toada, a 26ª Vara do Trabalho de São Paulo reconheceu vínculo empregatício entre sociedade de advogados e causídico que nela figurava como sócio. Segundo o juízo, o escritório incorreu em fraude, ao maquiar, “sob a fachada de pessoa jurídica, (…) uma contratação que se deu com pessoalidade, subordinação e habitualidade.”

No entanto, o aditamento ao contrato social (para inclusão de novo sócio) teve de ser assinado pelo advogado em questão, que, ao assim agir, optou livremente por integrar a sociedade. Embora na qualidade de sócio “júnior”, sob a orientação de colegas mais velhos e experientes. Detalhes para lá de relevantes, mas que passam despercebidos aos olhos de togados alheios às provas, e ávidos por implementarem sua própria visão de mundo.

08.01: julgamentos serão retomados em plenário virtual

A pedido do Ministro Alexandre de Moraes, a Ministra Rosa Weber determinou que os próximos réus do 08.01 venham a ser julgados em plenário virtual. Após as punições desproporcionais impostas aos três primeiros acusados, e em seguida à afirmação do advogado Sebastião Coelho sobre o suposto “ódio” da população ao STF, os togados deliberaram “esconder” os feitos contra mais de 1.000 réus, e passar a sentenciar, “em ambiente de menor repercussão”, casos em torno do episódio mais rumoroso do ano.

O recado já foi dado: aos críticos do atual “regime” (embora sem provas da prática de dano!), todo o rigor da constituição alexandrina. De agora em diante, nada de publicidade ou de sustentações orais icônicas; o destino dos réus será o que os juízes supremos quiserem. E ponto final.

“Curso de democracia” aos réus do 08.01?

O tal “curso” vem sendo cogitado, pela PGR, como condição para eventuais acordos de não-persecução penal, ou seja, para acordos que evitem a condenação de réus, até mesmo daqueles contra os quais não pesem qualquer prova da prática de depredação (!). Segundo o sub-procurador geral, Carlos Frederico Santos, “a ideia é despertar essas pessoas, mostrar que o golpe de Estado não é uma coisa boa para o Brasil.”

Poderemos ter réus sujeitos a uma constrição não prevista em lei, e de contornos bem semelhantes aos dos “campos de reeducação” em moldes maoístas. É ver para crer.

Cabral na iminência de ser liberado da tornezeleira

O Ministério Público Federal se manifestou favoravelmente a pedido da defesa do ex-governador do RJ, por entender que Cabral, após usar “fielmente” a tornezeleira eletrônica por oito meses, já pode ser liberado do equipamento. Assim, o político, outrora condenado a mais de 400 anos de prisão por esquemas comprovados e até confessos de corrupção grossa, deverá, muito em breve, circular sem qualquer monitoramento. Sabe-se lá para o exercício de quais atividades, ou para o contato com quais figuras não muito ilibadas…

Por prescrição, STJ extingue punição de político

Condenado por peculato, após apropriação de valores destinados ao custeio de passagens aéreas, o ex-deputado Ronald Ribeiro acaba de ter extinta a sua punibilidade. Diante do tempo decorrido ao meio aos inúmeros recursos, o político, apesar de ter comprovadamente embolsado recursos públicos, deixará de ser punido devido à prescrição. Justiça que tarda falha. Esse é o maior “lema” do nosso universo judiciário.

Toffoli contra o Marco Temporal

“A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal.” Com base nessa premissa, o togado se manifestou contrariamente ao Marco, que reconhece a posse de povos indígenas tão somente em terras já ocupadas em 5 de outubro de 88 (entrada em vigor da atual Constituição).

O STF se encaminha para formar maioria desfavorável à tese, em um dos julgamentos mais delicados para nossa própria estabilidade social. Usurpando atribuição legislativa, pois o Marco ainda aguarda votação no Senado, os togados supremos, se confirmarem mais esse entendimento esdrúxulo, poderão nos lançar a um abismo inédito de insegurança. Ninguém saberá ao certo qual terra poderá ser reivindicada por quem, muito menos quando, e com base em quais critérios.

Rosa em defesa dos direitos políticos de Dilma

Diante da determinação inconstitucional do então Ministro Lewandoswki de manter os direitos políticos da ex-presidente Dilma Rousseff, mesmo após impeachment desta, os partidos PSDB, DEM, PPS, MDB e Solidariedade haviam ingressado no STF contra a decisão. Somente seis anos depois, a Ministra Rosa Weber colocou o assunto em pauta.

E, em postura previsível, Rosa “tomou as dores” de sua nomeante, mediante o entendimento de que “a pretensão dos partidos de “transplantar” os votos obtidos para a perda do cargo, também para a supressão de direitos políticos, implica em uma “indevida substituição””. Porém, longe do que pretende fazer crer a togada, essa não é a “pretensão” de uma ou outra sigla. É determinação textual da Constituição, que aponta a inelegibilidade como consequência necessária do impeachment.

Para o Supremo, não bastou uma violação à Lei Maior. Forçosa é sua ratificação pela atual presidente da corte, inclusive como modo de inversão da narrativa sobre fatos políticos. A “novela” prossegue, com os próximos votos.

*Kátia Magalhães é advogada, liberal e apaixonada por arte e cultura.

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