Por Marcus Dias*
Fechar os olhos na Gamboa e acordar na Avenida 24 de Julho em Lisboa, num primeiro momento, pode nos dar a impressão de que ainda seguimos na mesma cidade que, em virtude da enorme similaridade do Tejo com a nossa baía, deu ao desbravador português, que por aqui chegou, a impressão de estar aportando numa terra nova por meio de um rio.
Para além do idioma, da arquitetura, da culinária, da literatura, a geografia da capital lusitana é, inegavelmente, parecida com a da capital que Dom Joāo VI escolheu para ser a sua aqui no Brasil. É impossível olhar para o rio declamado em versos por Camões e não lembrar da nossa Guanabara; os bares, a gente bonita e alegre nas ruas, a música típica que nos lembra muito o nosso chorinho, até a ponte que nos une ao restante do Estado se assemelha com a que liga a capital portuguesa ao seu redor. Se há uma cidade irmã do Rio de Janeiro é Lisboa!
Mas se no macro a semelhança é máxima, no micro, ao olharmos para a vida do carioca e do lisboeta, as diferenças são maiores do que a extensão do Atlântico. A começar pelo trânsito que, na terra natal de Fernando Pessoa, não nos dá a impressão de paralisia por lá, passando pela indefectível limpeza absoluta da cidade que nos faz, muitas vezes, ter a impressão de que vivemos, por aqui, numa casa nunca faxinada. Mas o que nos chama mais atenção nesta diferença é em relação ao turismo e ao lazer, vocações inequívocas da Cidade Maravilhosa que, perto da atividade lisbonense, nos faz parecer uma vila do interior de deus-me-livre ou uma cidade fantasma da China.
Enquanto o centro de Lisboa é um organismo vivo, com intensa atividade cultural, de lazer e turística, nosso centro do Rio é uma entidade em estágio de decomposição, onde não se vê vida, não se tem segurança e não há atividade pulsante que gere riqueza à cidade, como existia desde os tempos imperiais.
Se há mais de 500 anos foram as naus de Lisboa que vieram aqui nos conhecer agora, nos parece, que é a vez de fazermos o inverso e irmos buscar em nossas raizes lusitanas soluções para problemas que hoje temos por aqui e eles já superaram por lá. Buscar soluções em cidades como Nova Iorque, como se costuma ouvir de alguns, pode parecer tentador mas – em que pese o esforço do maestro Tom Jobim – hoje em nada se assemelha o Soho à nossa Gamboa.
Voltarmos nosso olhar para além-mar é uma ótima alternativa para a cidade do Rio de Janeiro. As armas para redescobrir nossa vida cultural, ativar nossa mobilidade e recuperar nossa conservação, especialmente na área central da cidade, são os instrumentos de gestão; e os barões assinalados, hoje, são todos aqueles que na certidão, ou em espírito, se consideram cariocas da gema…
*médico formado pela UFF, com MBA em gestão em saúde pela USP e mestrado em economia pelo IBMEC.