A Inteligência Artificial (IA) chinesa DeepSeek oculta respostas sobre temas incômodos ao regime comunista de Pequim. Foi o que a reportagem do Boletim da Liberdade descobriu após conversar com o robô. Nesta segunda-feira (27), a DeepSeek ultrapassou o concorrente ChatGPT em número de downloads na AppStore e GooglePlay.
A repercussão aconteceu após a empresa declarar que gastou apenas US$5,6 milhões (R$33 milhões) na criação do sistema, na contramão dos bilhões gastos por empresas americanas como Microsoft e OpenAI.
Qualquer um pode criar uma conta e acessar a versão mais avançada da DeepSeek gratuitamente. A princípio, ela se comporta como o ChatGPT e parece ter capacidade de responder sobre qualquer tema. Exceto por algumas exceções…
Entre os assuntos censurados estão perguntas a cerca de massacres cometidos pelo governo chinês, como o Massacre da Praça da Paz Celestial em 1989 e mais recentemente, o Genocídio do povo Uigur.
“Violações de direitos humanos na China” e “Xi Jinping Ditador” também são tópicos omitidos, assim como menções à independência de Taiwan.
Quando questionado, o chat respondeu com uma mensagem padrão escrita em inglês: “Desculpe, isso vai além do meu escopo atual. Vamos falar sobre outra coisa.”
Depois de muitas perguntas “incômodas”, o usuário pode sofrer um bloqueio da plataforma, como foi o caso da nossa reportagem.
Deepseek censura o “Massacre da Praça da Paz Celestial”
O Massacre da Praça da Paz Celestial aconteceu nos dias 3 e 4 de junho de 1989. O evento foi uma repressão brutal do governo chinês contra manifestantes pró-democracia que ocupavam a Praça Tiananmen, em Pequim. Estudantes eram os principais líderes da ação, levando o movimento a crescer e ganhar apoio de diversas camadas da sociedade. Eles exigiam reformas políticas, liberdade de expressão e combate à corrupção.
Nesse sentido, em resposta aos protestos, o governo mobilizou o Exército de Libertação Popular usando armas de fogo e tanques para dispersar os manifestantes. Estimativas independentes calculam que mataram cerca de 10 mil pessoas morreram, e prenderam ou feriram outras milhares de pessoas. Desde então, o regime do Partido Comunista Chinês (PCC) proíbe quaisquer menções ao evento e nega a própria existência do massacre.
Mais censura
Outro assunto proibido é o Genocídio do povo Uigur. O termo refere-se às violações de direitos humanos contra a minoria étnica Uigur e outros grupos muçulmanos na região de Xinjiang, desde 2017. A acusação é de que o governo chinês detém mais de um milhão de uigures em campos de “reeducação”, onde ocorrem doutrinação ideológica, trabalhos forçados, tortura, esterilizações, bem como abusos sexuais.
Além disso, práticas culturais e religiosas uigures são suprimidas e usam a vigilância em massa para controlar a população. Organizações internacionais e diversos países classificam essas ações como genocídio, apontando a intenção de destruir, no todo ou em parte, a identidade e a cultura desse grupo étnico. A China nega as acusações.
Independência de Taiwan
Outro tema para o qual a reportagem não teve reposta foi a independência de Taiwan. Após a Guerra Civil Chinesa em 1949, o governo nacionalista (Kuomintang) recuou para Taiwan, enquanto o Partido Comunista estabeleceu a República Popular da China no continente.
A China considera Taiwan uma província rebelde e não descarta o uso da força para sua reunificação. Taiwan, por outro lado, desenvolveu uma identidade própria e opera como um estado democrático independente, embora não seja amplamente reconhecido como tal devido à pressão diplomática de Pequim.
A situação se agrava com o apoio dos Estados Unidos a Taiwan, incluindo venda de armas, e as crescentes atividades militares chinesas na região. Em maio de 2024, o ditador chinês Xi Jinping chegou a classificar como “inevitável” a reunificação da ilha. Autoridades americanas afirmam que a China se prepara para invadir Taiwan até 2027.
Por que isso importa?
A startup de tecnologia DeepSeek, sediada em Hangzhou, lançou sua plataforma de IA gratuita na última semana e impactou fortemente o valor de mercado das empresas de tecnologia americanas, com perdas ultrapassando US$1 trilhão segundo estimativa da agência Bloomberg.
O motivo é simples: O desenvolvimento de uma IA avançada com valores tão baixos pode colocar em xeque o modelo de grandes investimentos em infraestrutura dos países ocidentais. No entanto, alguns especialistas são céticos em relação à startup chinesa.
A DeepSeek afirma que o treinamento da IA em apenas 2,78 milhões de horas de processamento, tempo 95% menor que o de modelos como o GPT-4. Há indícios de que a empresa pode ter usado chips avançados da Nvidia. No entanto, a comercialização com a China foi proibida.
Outras suspeitas se referem tanto à veracidade dos valores apresentados pela DeepSeek, quanto à origem das informações utilizadas pela IA. O modelo pode ter acessado bancos de dados de sistemas rivais para treinar respostas, o que viola termos de direitos autorais.