Por Allan Freire
Desde muito cedo, ouvimos falar sobre os problemas do Brasil — e bem sabemos que eles são inúmeros. Basta assistir ao jornal local para ver um mar de sangue ou as corriqueiras notícias sobre casos de corrupção. Em uma conversa informal com uma pessoa simples da comunidade, ouvi a seguinte frase: “Não sei como ainda existem mulheres no Brasil, todos os dias vemos notícias de assassinatos delas.” Infelizmente, essa é a realidade. Diante de tantos problemas, me perguntei: qual seria o maior problema do Brasil? Neste pequeno artigo, compartilho a minha conclusão diante dessa indagação.
Recentemente, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, disse a seguinte frase:
“Muita gente achava que eu jamais iria voltar, porque o político, quando rouba, submerge; quando ele faz qualquer bobagem e sai uma denúncia, ele já se esconde e fica escondido. Eu, ao invés de me esconder, fui pra cima dos acusadores.”
Essa fala reflete a cultura do país. Infelizmente, hoje somos uma nação marcada pela cultura da corrupção, e a pessoa que ocupa o mais alto cargo da República é um símbolo disso. Ele mesmo admite, em tom jocoso, que inventava dados sobre o Brasil para usar em reuniões no exterior.
Este é o mesmo país que, durante a Operação Lava Jato, viu criminosos confessarem seus delitos e devolverem recursos desviados aos cofres públicos. Apenas nessa operação, foram recuperados aproximadamente 4 bilhões de reais oriundos de obras públicas superfaturadas. Anos depois, todos esses criminosos foram “descondenados” pelo Supremo Tribunal Federal (STF), retornaram à cena do crime e, agora, alguns chegam a acionar a Justiça para reaver os valores que haviam sido devolvidos.
No mesmo Brasil, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) libertam traficantes com imensa facilidade — e sem o menor constrangimento. Muitos especialistas já consideram o Brasil um narcoestado, e as notícias diárias apenas reforçam essa percepção. Um exemplo emblemático é o caso do traficante André do Rap [1], que ganhou grande repercussão nacional. Condenado a 25 anos de prisão, ele cumpriu apenas 13 meses antes de ser solto por uma decisão, no mínimo, controversa do STF. Mais recentemente, o ministro Gilmar Mendes libertou um traficante preso com nada menos que 188 kg de cocaína [2]. Como acreditar em um país cuja Suprema Corte age dessa forma?
O ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, confessou ter desviado milhões de reais, foi condenado a mais de 400 anos de prisão e, ainda assim, acabou sendo liberado pelo STF. Hoje, transformou-se em influenciador digital, gravando vídeos em uma cobertura que, muito provavelmente, foi adquirida com recursos oriundos da corrupção [3]. A ONG Transparência Internacional Brasil emitiu uma nota de repúdio, destacando a seguinte frase: “símbolo da impunidade brasileira” [4]. Vale lembrar que o voto decisivo para sua soltura foi proferido pelo ministro Gilmar Mendes, que acompanhou o voto do ministro Ricardo Lewandowski — atual Ministro da Justiça do governo Lula. Apenas coincidências.
Voltando aos casos de violência, o que mais ocupa espaço na mídia é a violência contra mulheres. Todos os dias somos confrontados com casos bárbaros de feminicídio — e há algo em comum entre eles: a maioria esmagadora dos criminosos são reincidentes. Encobrindo a realidade com subterfúgios, o Governo constantemente lança campanhas afirmando que está tomando medidas para enfrentar o problema. É comum, no Dia Internacional da Mulher, o Congresso Nacional dedicar sua pauta exclusivamente a projetos de lei que supostamente “protegem” as mulheres — como se um texto impresso em papel pudesse, por si só, transformar a trágica realidade do Brasil.
No último Dia Internacional da Mulher, durante o programa Encontro com Patrícia Poeta, exibido pela Rede Globo, uma porta-voz da Polícia Militar de São Paulo apresentou a ficha criminal de um único criminoso que já havia sido preso 16 vezes. A policial destacou o problema da reincidência criminal e o desestímulo gerado entre os profissionais da segurança pública, que veem o poder Judiciário frequentemente desfazer o trabalho da polícia.
Mas afinal, qual é o maior problema do Brasil? Corrupção? Violência doméstica? Nenhum dos dois. O maior problema do Brasil chama-se IMPUNIDADE.
A impunidade é o verdadeiro combustível da criminalidade. No Brasil, a chance de um criminoso cumprir pena por um crime cometido é extremamente baixa — o que estimula a prática de delitos e alimenta tanto a insegurança quanto a percepção generalizada de corrupção no país.
Apenas 4 em cada 10 homicídios são esclarecidos no Brasil [5]. Isso é um verdadeiro absurdo, especialmente considerando que, em 2024, ao menos uma mulher foi vítima de feminicídio a cada 17 horas [6]. Além disso, 97% dos crimes de corrupção no país ficam impunes [7]. Se você puxar pela memória, é provável que não consiga sequer lembrar dos poucos 3% que realmente foram punidos de forma exemplar.
É impossível falar sobre impunidade sem pensar no Poder Judiciário. Antigamente, ao se falar em corrupção, pensava-se em políticos usando seus mandatos para desviar dinheiro público. Naquela época, nossa esperança estava depositada na boa imagem do Judiciário — que seria, teoricamente, o “herói” incumbido de fazer cumprir a lei e restaurar a ordem. Contudo, essa imagem foi completamente destruída. Hoje, o que se evidencia é que o Judiciário se tornou o mais podre dos três poderes da República.
Essa conclusão não decorre de uma melhora na imagem dos Poderes Executivo e Legislativo, mas sim pela desesperança da população em ter um Judiciário corrupto que age prioritariamente em busca de privilégios e benefícios para si e para os seus. Se o Poder Judiciário é corrupto e garante a impunidade, a quem podemos recorrer?
Há tempos o Judiciário parece ter abandonado as leis e a Constituição Federal. Suas decisões, frequentemente, são guiadas por interesses próprios, políticos ou, por vezes, obscuros. Decisões absurdas são tomadas ao arrepio da lei e da Constituição, punindo inimigos da Corte e garantindo a impunidade de seus apadrinhados. A certeza da impunidade é a mola propulsora da corrupção.
Retomando o tema da violência, a impunidade também é o combustível que alimenta os crimes no Brasil. Apenas em 2024, o país registrou 38.722 assassinatos [8] — números equivalentes aos de uma zona de guerra. A violência doméstica cresce diariamente, impulsionada pela convicção dos agressores de que não haverá punição. É comum encontrar casos em que o mesmo agressor foi autuado diversas vezes por violência doméstica, e, em muitos desses casos, a escalada das agressões termina em feminicídio. É raro um caso de feminicídio em que o autor não seja reincidente.
Pensando em possíveis soluções para o enfrentamento da impunidade nos casos de violência, é indispensável promover uma reforma dos Códigos Penal e de Processo Penal. Além disso, é fundamental revisar a Constituição Federal para retirar a proibição de penas de caráter perpétuo. Quem tira a vida de outra pessoa jamais deveria voltar ao convívio social em liberdade. Além do que, todos os presidiários deveriam trabalhar para pagar os seus custos, que hoje estão em média de R$ 2.332,49/mês, podendo chegar em alguns casos a R$ 4.367,55/mês [9]. Ações como estas diminuiriam a impunidade no país.
Ainda, é necessário endurecer as leis e criar mecanismos eficazes para garantir que elas sejam cumpridas. Se um homem, ainda jovem, ao cometer agressão contra uma mulher, fosse devidamente punido com reclusão por um longo período, dificilmente reincidiria nesse tipo de crime. Quando um crime é cometido sem que haja punição, o agressor se sente encorajado a agir novamente. Para coibir novos crimes, é essencial que exista punição proporcional, firme e eficaz.
No caso da corrupção, não faltam leis que a inibam — o que tem garantido a impunidade é o Poder Judiciário, muitas vezes com o respaldo do Supremo Tribunal Federal. Se a Suprema Corte é a instância máxima de justiça no país, mas hoje tem se incumbido de promover a impunidade, então providências precisam ser tomadas. E, antes que se pense que falo aqui em medidas de ruptura do estado democrático de direito, se é que ele ainda existe no Brasil, refiro-me ao instrumento mais básico e poderoso que o cidadão possui: o voto.
Em 2026, teremos eleições, e é fundamental que o próximo pleito tenha como foco a escolha consciente de representantes para o Senado Federal — órgão que possui a prerrogativa constitucional de conter os excessos do Judiciário e garantir que este atue dentro dos limites da Constituição Federal. Precisamos eleger senadores comprometidos com o fim da impunidade no Brasil e dispostos a promover reformas significativas no sistema de justiça.
Apesar de o Brasil já ter passado por dois processos de impeachment presidencial, nunca houve, até hoje, o afastamento de um ministro do Supremo Tribunal Federal. Isso se dá não por falta de previsão legal — a Constituição é clara ao atribuir ao Senado Federal a competência de processar e julgar ministros do STF por crimes de responsabilidade —, mas sim por uma evidente falta de vontade política. O que vemos, na prática, é uma blindagem institucional quase absoluta desses magistrados, que, mesmo diante de decisões polêmicas, abusos e críticas contundentes da sociedade, seguem inatingíveis. Essa falta de responsabilização enfraquece o sistema de freios e contrapesos da República e reforça a percepção de que existe, no Brasil, uma casta de autoridades acima da lei.
Por fim, é essencial eleger parlamentares dispostos a revisar o processo de nomeação dos ministros do Supremo Tribunal Federal, estabelecendo mandato com prazo fixo e retorno às suas atividades anteriores ao fim do período na Corte. Nesse sentido, já existe a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 225/2019), de autoria do deputado Paulo Ganime. É fundamental apoiar Senadores e Deputados que se comprometam com essa proposta, bem como com outras iniciativas semelhantes em tramitação no Congresso Nacional.
Diante de tudo o que foi exposto, torna-se evidente que o maior problema do Brasil é a impunidade. Ela corrói as estruturas do Estado, mina a confiança da população nas instituições e alimenta um ciclo contínuo de crimes sem consequências. Quando o Judiciário, especialmente a mais alta corte do país, falha em cumprir seu papel com isenção, respeito à Constituição e responsabilidade, ele deixa de ser o guardião da justiça para tornar-se parte do problema. Não se combate impunidade com discursos ou leis ineficazes, mas com ações firmes, reformas estruturais e vontade política.
Em 2026, os brasileiros terão mais uma oportunidade de usar a força do voto para eleger representantes comprometidos com o reequilíbrio dos poderes, a responsabilização dos que se julgam acima da lei e o fortalecimento do Estado de Direito. O futuro do Brasil depende, mais do que nunca, da coragem de enfrentar aqueles que se escondem atrás da toga e da impunidade.
ALLAN FREIRE
Gama-DF, 10 de abril de 2025
[2] https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/alexandre-garcia/stf-solta-homem-com-cocaina-alegando-bons-antecedentes/
[4] https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/01/21/video-de-cabral-na-piscina-em-cobertura-na-lagoa-e-criticado-por-ong-simbolo-da-impunidade-brasileira.ghtml
[6]
[7] ://www.camara.leg.br/noticias/495541-97-dos-crimes-de-corrupcao-no-brasil-ficam-impunes-diz-dallagnol/
[8] https://g1.globo.com/politica/noticia/2025/01/17/assassinatos-brasil-ministerio-justica.ghtml
[9] https://www.metropoles.com/brasil/presos-custam-de-r-1-mil-a-r-4-mil-por-mes-a-estados-veja-ranking